Adoração

Na segunda-feira decidi que era melhor segurar um pouco o gás para ver filmes, principalmente os que não fazia tanta questão de ver no cinema e podia ver no vídeo, e escrever mais sobre a Mostra e eventos que acontecem na Mostra. Pulei dois filmes, fiquei numa estranha fila para uma 2ª, meio da tarde, provavelmente causada pela decisão de algumas pessoas que escolheram começar a Mostra naquele dia, e fui almoçar. Regra número um: nunca passar fome na Mostra ou outros festivais. Fome me dá sono e daí eu não vejo filme algum. A idéia de ganhar tempo para ver mais resulta em menos filmes realmente vistos.

Parti direto para o último filme do diretor canadense Atom Egoyan: Adoração (2008). Eu gosto dos filmes dele, da narrativa lenta, do mistério que se apresenta no começo e só no fim é resolvido, dos diálogos cheio de questionamentos filosóficos, ou que às vezes param na intenção, e do modo como ele tenta mostrar os dois lados do problema. Digo que gosto porque o seu estilo pouco muda nos filmes. Se não gostou de um duvido que goste dos outros. Simples assim.

Adoração questiona até que ponto alguém chega em busca de atenção e em busca da verdade. Simon, um adolescente que mora com o tio, começa a explorar uma mentira através da tradução de uma reportagem sobre um terrorista que plantou uma bomba na bagagem da namorada grávida. Instigado pela professora a ir mais fundo e escrever uma peça sobre isso, ele começa a repassar como verdade através de video-chat. A história que começa confusa vai aos poucos se resolvendo, mas não é das mais entusiasmantes já escritas por Egoyan.

O debate sobre atentados, que obviamente é uma reflexão sobre atentados terroristas no mundo, especialmente EUA, acaba ficando vago, e a história do passado de Simon também não é forte o bastante para impressionar o público. A parte realmente mais interessante é como a internet transforma anônimos em famosos, e abre espaço para todos darem seu relato, verdadeiro ou não, alterando a própria verdade. Apesar de tudo o filme é bonito, mas fraco.

O Clone volta pra casa

Meu dia terminou com O Clone Volta para Casa (2008), de Kanji Nakajima. O filme que faz parte da seleção de filmes de Wim Wenders para a 32ª Mostra Internacional de Cinema, a Carta Branca a Wim Wenders. Para ser sincera eu tenho um certo problema com os filmes do diretor alemão: eles são lentos demais para o meu gosto. Não me entenda mal, eu não sou fã de filmes que parecem vídeo clip e não tenho problema algum com boa parte dos filmes iranianos, lentos demais para a maior parte das pessoas. Filmes podem, e devem ser lentos, quando condizem com o argumento, e tem esse ritmo para criar a atmofera, explorar o ambiente, apresentar as personagens, refletir sobre o filme. Entretando, quando não me acrescentar nada são apenas chatos.

Tive problemas para terminar de ver alguns do diretor alemão, que apesar de belos me cansaram. Valeram a pena, mas poderiam ter algumas cenas a menos, ou não tão longas. Deixando claro que não faço parte do time dos adoradores, vou para O Clone: chatíssimo. Merece o prêmio de filme mais chato até agora, ganho com a existência de muito tempo morto, diálogos que não sustentam o filme, narrativa fraca, cenas longas demais que ao contrário de serem bucólicas parecem apenas consumir mais tempo, apresentação visual fraca não despertando interesse no espectador, e intenso poder de dar sono no espectador.

O problema é que o argumento parecia interessante: filme de ficção científica japonês, que analisa o problema da clonagem através de uma história futurista. Para mim, nas pior das hipóteses, o filme seria engraçado. Ledo engano. Não posso negar que algumas cenas eram tão absurdas que eram engraçadas, mas não o salvou para mim. Deveria ter visto qualquer outra coisa, até ver novamente o A Fronteira da Alvorada, belo filme de Philippe Garrel aliás, ou ido para casa.

Sonata de Tóquio

Apesar de tudo um filme salvou meu dia: Sonata de Tóquio (2008), de Kiyoshi Kurosawa.  O diretor japonês fez um filme tocante sobre uma típica família japonesa, que aos poucos vai se desestruturando. Primeiro o pai perde o emprego, não consegue achar outro para o mesmo cargo e continua mentindo para a família. O filho mais novo quer ter aulas de piano, e uma vez que o pai não permite achando uma bobagem, ele começa a fazer escondido. O filho mais velho volta a hora que quer para casa e não consegue um emprego também. E a mais por sua vez vai ficando cada vez mais frustrada com toda essa situação, sem deixar transparecer, pois é ela que deve manter todos unidos.

Kurosawa critica o problema de desemprego no Japão, o envolvimento com guerras externas, a falta de tato e respeito entre os próprios familiares. Sonata de Tóquio é um filme leve e cativante. Aos poucos o espectador vai se envolvendo com as personagens, seus conflitos e a evolução delas. Pontuado com ótimas cenas de humor intercaladas com drama, o filme se deselvolve ao redor das mentiras que cada um conta para continuar vivendo sem se expor, sem perder o respeito ou ser contrariado.

No momento em que o pai perde o emprego há duas opções: admitir sua falta de flexibilidade e seu fracasso, ou mentir para a família e manter seu status. Seu orgulho o faz escolher a segunda e encontrar cada vez mais dificuldades em uma Tóquio super povoada, sem muitas chances de sucesso para aqueles sem talento, especialização ou de difícil adaptação.

Mas Sonata de Tóquio não é sobre quem fica com os melhores empregos. É  sobre como pequenas atitudes como respeitar as escolhas dos outros, tentar entendê-los e aceitar os nossos problemas de modo realista. Um pequeno passo desses não faz com que mudemos o mundo ou tudo voltar ao normal, e faz sim com que sejamos um pouco melhores e mais felizes com a nossa realidade.

7 respostas para “Sonata de Tóquio salva o dia”.

  1. Opa Bibi!

    Então, pelo jeito o Clone realmente é chato. Além de vc, mais duas pessoas comentaram no meu blog dizendo isso… 🙂

    Até!

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  2. Adorei “Sonata de Toquio”. Só não concordo com a descrição na Folha de São Paulo como sendo um filme que arranca momentos de pavor com cenas singelas. O filme está mais para humor negro do que suspense. No mesmo dia assisti “Adoração” e “A Fronteira da Alvorada”, todos no Cinesesc. “Adoração” não é incrivel mas manteve meu interesse, ainda acho um bom filme. “A Fronteira da Alvorada” talvez seja um pouco frances demais para o meu gosto mas ainda assim gostei muito da fotografia PB. Hoje assisti dois filmes muito bacanas, o simpático “Tulpan” e o ótimo terror singelo de “Deixa Ela Entrar”. Excelente e criativo filme de vampiro. Vai agradar a quem não gosta do gênero também.

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  3. Oi Fugita, vi seu post também. É chato, e quase nada se salva. Quem sabe te encontro esse final de semana. Até mais 🙂

    Oi Luiz, eu postei uma mensagem no twitter falando que o A Fronteira da Alvorada era apenas para quem é fã de cinema francês mesmo. Você tem razão, adoração não é o melhor Egoyan, é bom, bem feitinho e nada de mais.

    O sueco Deixa ela entrar está na minha lista. Vou vê-lo amanhã. Adoro as novidades do cinema sueco e não resisti quando vi a sinopse. Bom saber que não vou perder meu tempo, como acabei fazendo hoje com algumas coisas.

    Com relação à Folha: eu ignoro boa parte do que dizem. Aliás, o que parece bizarro, eu evito ler críticas antes de ir ao cinema. Eu prefiro ler uma sinopse para ter idéia da história. Comentários acabam influenciando o que se vê na tela, e o resultado na hora de escrever depois não é mesmo.

    O que eu acho que acontece com a maioria dos críticos é achar que cinema apenas para entreter não é bom. Eu adoro filmes “cabeça”, mas a maior parte das pessoas vai ao cinema para se divertir. Eu só não “aprovo”, por assim dizer, filmes que chamam o espectador de idiota ou óbvios demais. Não precisa ser genial, precisa prender a atenção.

    Abraços e bons filmes.

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  4. Estava lendo agora que Hollywood se prepara para refilmar “Deixa Ela Entrar”. O que acontece com esses americanos que só fazem refilmar bons filmes de outros países (ou criar roteiros em cima de videogames estúpidos)? Será que os americanos só são capazes de olhar para o próprio umbigo? O único idioma aceitável para se ver um filme é o deles? Precisam refilmar um bom filme estrangeiro porque tem preguiça de ler legenda? Ridiculo!

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  5. Bom, não é só refilmar bons filmes de outros países, mas eles fazem isso por diversos motivos. Um deles é colocar em idioma nativo filmes cujos temas são universais, e filmes de vampiros se encaixam aí. Idioma nativo porque o pessoal não é fã de legenda e dubla as coisas, assim como os franceses, os italianos, os alemães… digamos que eu gosto do nosso cinema com legendas.

    Outra coisa é a garantia de sucesso. Refilmar um filme que fez sucesso é a certeza de público. Se o pessoal gostou por lá, apesar dos atores desconhecidos e de ser um filme estrangeiro, por que não transformar em sucesso internacional com atores conhecidos já que a temática agradou?

    E como você já deve ter notado não é só filme estrangeiro, em algumas buscas você acha diversas versões de uma mesmo filme, desde os mudos até versões mais novas. Quando a história cai no gosto popular eles tentam explorar ao máximo. Eu já vi refilmagens melhores que originais, mas foram pouquíssimos.

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  6. Gostaria de saber em qual canal de televisão passou o filme Sonata de Toquio.Assistí uma vez, mas não me recordo, se num dos canais HBO ou na tevê Futura ou Cultura.Alguém poderia me ajudar ? Grato.

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  7. Google salva 😉 Eu vi no cinema, mas fiz uma pesquisa e o filme faz parte do acervo do HBO Max.

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